"Você deve estar querendo me matar" disse o cliente, caminhando pelo imóvel vazio com a pouca visibilidade que o começo da noite permitia.
"Isso depende" respondeu o arquiteto, escondendo a mão atrás do couro estufado da pasta sob o braço. "você trouxe o pagamento?"
O cliente tossiu um sorriso curto, raspou o barro da sola do sapato e tentou de novo: " Ah, esse projeto... Seu talento não tem preço... Trouxe os novos executivos?!"
"Compatibilizados e revisados. Sim, é a minha obra-prima. E pretendo receber por ela."
"Ótimo. Então me entregue."
"Ótimo. Então pague."
O cliente virou-se para o futuro jardim, como se já o contemplasse ali: "Mas temos tanta obra pela frente ainda!!! Vai ser difícil continuar sem você."
"Você não precisa de mim... Você nem me escuta!!! Desde que aprovei o projeto na prefeitura, você parou de me pagar, de me ligar e saiu construindo o que bem entendeu" disse o arquiteto, fixando o olhar em um ponto do jardim.
"Não agüento mais ver meu projeto ser desfigurado desse jeito" completou, sacando uma trena da pasta e enquanto marchava em direção ao cliente: "Olha esse buraco no meio do jardim, por exemplo!; isso não está no projeto. Para que diabos você mandou cavar isso?!?
"Irônico você perguntar" pigarreou o cliente, enquanto acertava a empunhadura da enxada acima dos ombros "toda casa que eu construo tem um desses; eu chamo carinhosamente de 'habite-se'"
http://www.architecture.blogger.com.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário